A caixa de entrada lotada, a lista repleta de tarefas, a pressão por resultados, o feed de notícias cheio de vidas perfeitas e a sensação constante de que o tempo está se esgotando. Essa é a realidade de muitos brasileiros que se veem imersos em uma sobrecarga diária de estresse. Segundo o Relatório Global de Bem-Estar no Trabalho de 2024 do Indeed, quase 60% dos trabalhadores se sentem estressados na maior parte do tempo.
Mas antes de pensar que o estresse é sempre um inimigo, é importante saber que ele nem sempre é negativo. Sim, existe uma diferença entre o estresse bom e o mau. Entender essa distinção pode ajudar a lidar melhor com as tensões e até usá-las a seu favor.
O estresse bom pode impulsionar o crescimento pessoal, por exemplo. A psicóloga e arteterapeuta Alessandra Alencar explica: “Se você tem uma prova de vestibular ou concurso, você vai estudar para alcançar seu objetivo. No caso de uma entrevista de emprego, ele faz você se preparar para o evento. Passado o estresse, a pessoa pode refletir sobre si e usar a experiência como catalisador de transformação”. Ou seja, é aquela dose de adrenalina que motiva a sair da zona de conforto e alcançar metas.
Já o estresse mau é o oposto: sufoca e adoece. “É aquele que não permite a evolução, tira o sentido da vida e deprime“, contextualiza a psicóloga. Situações como instabilidade financeira, vulnerabilidade social, relacionamentos turbulentos, conflitos familiares, privação de sono, puerpério e o medo prolongado são gatilhos comuns para essa forma prejudicial de tensão.
Sinais de alerta: quando o estresse vira problema
Saber identificar os sinais é fundamental, afinal, o estresse, quando prolongado, pode se tornar um problema sério. “No corpo, temos a tensão muscular, a dor de cabeça (cefaleia tensional), distúrbios do sono (insônia, acordar várias vezes no meio do sono e sono não reparador), problemas gastrointestinais, alterações cardíacas, alterações respiratórias e labirintite. Emocionalmente, as manifestações são ansiedade, irritabilidade, desânimo, perda de controle, falta de concentração e dificuldade em tomar decisões”, detalha Alessandra.
Por isso, é recomendável ficar atento à duração e ao impacto desses sintomas. “O que temos que levar em consideração como alerta é o quanto esse estresse está nos afetando, se está permanecendo por mais de uma semana, os impactos e prejuízos que isso está trazendo para a vida social e profissional. Além de perceber se está perdendo a vontade de fazer atividades que gostava antes, se está tendo alteração de peso e de apetite”, destaca.
Mas o que tem levado tantos de nós a sentir essa pressão constante, seja ela boa ou prejudicial? Atualmente, diversos fatores contribuem para a intensificação do estresse, como o imediatismo e as redes sociais. “O nível de urgência hoje é muito maior que o de nossos antepassados, onde as coisas aconteciam em um tempo mais devagar e a espera fazia parte do processo”, comenta a psicóloga. Essa pressa se infiltra em todas as esferas da vida, do trabalho às relações pessoais, e encontra seu ápice nas redes sociais.
Projetadas para conectar, essas plataformas muitas vezes geram um ciclo vicioso de comparação e autoexigência. “As redes sociais geralmente mostram só o que tem de melhor nas pessoas, parecendo que todos são bem-sucedidos no trabalho, viajam sempre, fazem coisas divertidas e vivem em paz o tempo todo. A grande verdade é que não é bem assim”, alerta Alessandra. Ela explica que essa competição, muitas vezes fantasiada, leva a um desequilíbrio entre nosso mundo interior (anseios e percepções) e o mundo externo (exigências profissionais e tecnológicas). Quando constante, esse estresse se transforma em ansiedade.
Existe diferença na forma como homens e mulheres expressam o estresse?
A maneira como o estresse se manifesta varia de pessoa para pessoa. Ele se adapta às singularidades de gênero, idade e contexto de cada um. A psicóloga Alessandra aponta que, embora não haja regras rígidas, fatores biológicos, sociais, psicológicos e culturais influenciam essa vivência. “Não podemos chegar a uma conclusão fechada, sobretudo, colocando rótulos para um gênero ou faixa etária, pois cada pessoa deve ser compreendida individualmente com suas singularidades e contexto socioeconômico”, ressalta.
As mulheres, por exemplo, enfrentam desafios sociais que potencializam o estresse. “Atualmente, por volta de 50% das mulheres se tornaram chefes de família. Algumas têm jornada tripla de trabalho, e mesmo uma jornada dupla, sem rede de apoio e sem a presença da figura paterna é um agravante de estresse para as mulheres, que sofrem uma sobrecarga e sem ter tempo de cuidar da saúde mental como deveriam“, menciona. Nelas, o sentimento de culpa, o cansaço extremo e a autocrítica aflorada são manifestações comuns. Ainda assim, as mulheres tendem a ser mais abertas à expressão emocional e à busca por ajuda.
Já os homens, muitas vezes condicionados por uma percepção patriarcal, evitam demonstrar sentimentos, temendo serem vistos como fracos. Fisicamente, podem apresentar dores, fadiga e insônia. Emocionalmente, a dificuldade de expressão se traduz em irritabilidade, impulsividade, agressividade ou até indiferença e silêncio.
A idade também delineia diferentes cenários de tensão:
- Jovens e adolescentes se sentem pressionados por questões como a inserção no mercado de trabalho, a busca por aceitação em grupos sociais, a formação de uma identidade e a autonomia;
- Adultos lidam com a construção de uma carreira sólida, a formação familiar e o desafio de equilibrar vida profissional e pessoal, com o estresse muitas vezes ligado à produtividade e ao sentimento de inadequação. Adultos de meia-idade podem vivenciar um conflito entre o que fazem e o que realmente gostariam de fazer;
- Adultos a partir de 45 anos e idosos encaram o estresse relacionado à saúde, ao luto, à perda de papéis sociais, à síndrome do ninho vazio e à saudade de tempos passados. Sentimentos melancólicos, apatia e adoecimento físico por questões emocionais podem ser mais frequentes nessa fase.
Sendo assim, se os sintomas de estresse atrapalharem sua rotina ou você sentir que não consegue mais lidar sozinho, buscar ajuda profissional é fundamental. Psicólogos e outros especialistas em saúde mental podem oferecer as ferramentas e o apoio necessários para você retomar o equilíbrio.