Com status olímpico e mais visibilidade nos últimos anos, a escalada tem deixado de ser uma prática de nicho para ganhar espaço em ginásios, parques e montanhas pelo Brasil. Estima-se que cerca de 35 milhões de pessoas no mundo pratiquem a modalidade. O reflexo desse crescimento pôde ser visto em maio deste ano, quando Curitiba recebeu a primeira etapa da Copa do Mundo de Escalada realizada na América Latina. O evento reuniu mais de 100 atletas de 23 países, com disputas na modalidade boulder, em que os competidores escalam rotas curtas e técnicas, com colchões no solo para amortecer quedas.
Escalada ganhou mais evidência com as Olimpíadas
Para Pedro Araújo, sócio da Fábrica Escalada (ginásio localizado em São Paulo que nasceu para transformar a experiência da escalada indoor e promover o esporte no Brasil), a presença nas Olimpíadas foi um marco importante, mas não o único fator para esse avanço. “Eu notei que uma coisa puxa a outra. O esporte ganhou mais projeção e evidência com as Olimpíadas, mas teve a mesma exposição quando o documentário Free Solo ganhou o Oscar. Propagandas, filmes, desenhos infantis passaram a ter escalada em seus roteiros. Estar na mídia e nas rodas de conversa é o que mantém o esporte em evidência e cria o desejo de praticá-lo”, contextualiza.
Ele lembra que, quando começou, o cenário era outro. “Descobri a escalada em dois momentos distintos. O primeiro através de um tio escalador que me levou para ter o primeiro contato com a pedra na infância. O segundo, já na adolescência, quando me mudei para perto de uma academia e pude praticar com frequência. Abrir o ginásio foi uma inquietação: no Brasil, eles eram focados no escalador ‘raiz’, enquanto na Europa e nos Estados Unidos estavam se tornando mais clean e democráticos. A Fábrica nasce assim e segue puxando esse mercado até hoje”, comenta.
Mas o que antes parecia uma prática distante da maioria, hoje se torna parte da rotina de vários brasileiros. É o caso de Ricardo Moura, editor audiovisual que trabalha com inteligência artificial e descobriu a escalada durante a pandemia da Covid-19. “Na época, tirei férias do trabalho e, depois da primeira onda da pandemia, um amigo me chamou para conhecer um ginásio que tinha reaberto. Fui e me apaixonei logo de cara”, conta. “Achei a atividade super bem pensada, com várias vias e desafios diferentes. E o ambiente também me conquistou, pois as pessoas eram muito receptivas. Já na primeira vez consegui subir e, dali em diante, não parei mais”, recorda.
Pedro diz que esse é um padrão que vê se repetir. “O tipo de pessoa que se encontra no esporte é aquela que gosta de solucionar problemas, quebra-cabeças e tem dentro de si um espírito aventureiro e desafiante. Como as vias mudam com frequência, o praticante volta mais vezes e acaba criando vínculos, marcando viagens e entrando em grupos de escalada”.
Além dos ginásios, praticantes gostam de viajar para escalar
Ricardo, que treina três vezes por semana, também leva a prática para casa. “Transformei um quarto em uma pequena caverna de escalada. Meu filho adora brincar lá. Mas meus treinos principais acontecem mesmo no ginásio perto de casa”. Ele também busca desafios fora: já escalou na Serra do Cipó (MG), na Via K2 no Rio de Janeiro e na Flona de Ipanema (SP). “É muito bom viajar para escalar”, pontua.
Samuel Silva, atleta de escalada esportiva e fisioterapeuta, começou a escalar aos 14 anos. “Comecei em São Bento do Sapucaí, uma cidade que respira montanha. O que me fez me apaixonar pelo esporte é poder praticar algo que não depende só do físico e sempre em lugares lindos. Um país que foi muito legal de competir e conhecer outra cultura foi o mundial juvenil na Rússia”, destaca.

Segurança e preparo na hora de fazer escalada
Além da força, escalar exige concentração. “A gente chama de meditação ativa, porque precisa ter foco total naquela hora e naquele lugar que você está tentando uma escalada. Para escalar bem, precisa manter a tranquilidade e ter o foco no problema que você precisa resolver. Isso porque a via de escalada é um problema que você resolve com seu corpo”, explica Ricardo.
A preparação física também é essencial para garantir segurança e um bom desempenho. Segundo Ricardo, o treino inclui exercícios para os dedos. “Antes de escalar, é importante aquecer e fortalecer dedos, tendões e músculos. Existem protocolos específicos para isso e, assim, você consegue escalar com mais prazer e menos risco de lesão”.
Se para o praticante esses cuidados significam treinar de forma consciente, para quem administra um ginásio eles envolvem ainda mais responsabilidades. Pedro reforça que a segurança é prioridade absoluta. “Todo esportista precisa estar ciente dos riscos, seja no futebol, no skate ou na escalada. Lesões podem ocorrer e fazem parte do aprendizado. O que fazemos é instruir todos a seguir corretamente os procedimentos de queda e segurança, respeitar limites e evitar riscos desnecessários. Assim, as chances de lesão são baixas”.
Para Samuel, ouvir o próprio corpo também pode ajudar nesse processo. “O cuidado mais importante é ouvir o próprio corpo, pois ele sempre avisa quando algo está errado, e ter paciência, porque a evolução vem”. Ele também reforça que lesões são comuns, mas podem ser prevenidas com atenção e treino correto.

Um ambiente de apoio e superação
Além dos benefícios físicos e mentais, outro fator que atrai praticantes é o clima colaborativo entre os escaladores. “A comunidade da escalada é muito especial. As pessoas se incentivam, vibram com as conquistas umas das outras, se ajudam. Quem vai pela primeira vez sempre comenta como o ambiente é legal”, diz Ricardo. Essa combinação de desafio, concentração e apoio coletivo faz da escalada uma prática completa e cada vez mais popular. “Desde que a escalada virou esporte olímpico, percebo mais gente se interessando. O número de praticantes no Brasil está crescendo”, observa.
Para quem quer começar, o primeiro passo pode ser mais simples do que parece: procurar um ginásio e experimentar. Como mostra as experiências de Ricardo e Samuel, uma única escalada pode ser o início de uma nova paixão.