Adiar a maternidade é uma decisão cada vez mais comum entre mulheres brasileiras seja por prioridades pessoais, profissionais ou por questões de saúde. Nesse cenário, o congelamento de óvulos tem ganhado espaço como alternativa para preservar a fertilidade e manter aberta a possibilidade de engravidar no futuro. Em 2023, mais de 115 mil embriões foram congelados no Brasil, segundo o Sistema Nacional de Produção de Embriões da Anvisa, um aumento de 32,8% em relação a 2020.
“O congelamento de óvulos é uma estratégia indicada em situações em que a mulher vai adiar a maternidade e esse adiamento representa uma ameaça à sua fertilidade”, explica a médica especialista em Reprodução Humana, Adriana Griz. De acordo com ela, existem dois contextos em que o procedimento costuma ser recomendado. “Falamos em congelamento de óvulos eletivo ou social quando a mulher adia a maternidade por motivos pessoais, sendo o mais comum a falta do parceiro ideal com quem deseje construir uma família, ou outras situações como investimento na carreira profissional, por exemplo”, comenta.
Nesses casos, o tempo se torna um fator decisivo. “O grande fator relacionado à possibilidade de conseguir ter um bebê é a idade da mulher. Dessa forma, esse adiamento vai aumentar a chance de dificuldade futura em engravidar e também uma chance menor de sucesso em um tratamento de fertilização in vitro. Ao congelarmos os óvulos, vamos ‘congelar’ as possibilidades de o tratamento dar certo de acordo com a idade em que realizou o procedimento”, contextualiza.
Outro grupo para o qual o congelamento pode ser essencial é o de mulheres diagnosticadas com doenças que afetam a fertilidade. “A principal situação de saúde que leva à indicação do congelamento de óvulos é o diagnóstico de determinados tipos de câncer, sendo o principal deles o câncer de mama. Infelizmente, a incidência de casos de câncer de mama em mulheres jovens, que ainda não completaram sua construção familiar, vem aumentando de forma preocupante”, revela.
Segundo ela, o tratamento do câncer costuma exigir quimioterapia, que tem alto potencial de comprometer o estoque de óvulos e pode levar à infertilidade. “A mulher deve ser imediatamente encaminhada para tentarmos viabilizar o congelamento dos seus óvulos antes do início do tratamento quimioterápico (o que na grande maioria dos casos de câncer de mama é possível), sendo realizados protocolos específicos de estimulação ovariana que não demonstram risco à sua saúde”.
Adriana destaca ainda que outras condições, como endometriose ovariana, doenças autoimunes e algumas alterações genéticas, também podem representar ameaças à fertilidade e justificar a indicação. “Cada caso deve ser avaliado por um médico especialista para um aconselhamento reprodutivo”, recomenda.
Qual é a melhor idade para congelar?
Embora o procedimento possa ser feito em diferentes fases da vida, a médica aponta quando ele tende a ser mais eficaz. “O ideal é que a mulher congele seus óvulos antes dos 35 anos de idade. A partir disso, a quantidade e a qualidade dos óvulos vão sendo comprometidas de forma mais acelerada”.
Ainda assim, não há uma idade limite. “Na verdade, não existe uma idade limite pré-determinada em que o congelamento seja possível. Quando a mulher procura o congelamento de óvulos em uma idade mais avançada, avaliamos como está seu estoque de óvulos atual para estimarmos com ela as chances de sucesso. Quanto maior a idade após os 35 anos, menores serão as possibilidades”, antecipa.
Como funciona o processo de congelamento de óvulos?
A especialista explica que o congelamento de óvulos é um processo simples e rápido. “Na consulta inicial, vamos avaliar a boa condição de saúde da mulher, através da anamnese e exames de rotina gerais, assim como sua reserva ovariana para traçarmos a estratégia do tratamento”.
O tratamento se inicia já no ciclo menstrual seguinte. “Iniciamos medicações para estimular os ovários para que possamos coletar o maior número de óvulos possível. Esse período de estimulação é realizado por cerca de 8 a 12 dias”, explica.
Quando o ovário está pronto, é feita a coleta. “Realizamos a coleta dos óvulos através de um procedimento que leva poucos minutos, no qual introduzimos, através da vagina, um transdutor de ultrassonografia com uma agulha acoplada e puncionamos o ovário para aspirar os óvulos. Isso é realizado com a mulher sob sedação, a mesma anestesia de quando fazemos uma endoscopia do estômago, e guiamos a agulha com ultrassonografia”. Em média, todo o processo dura cerca de duas semanas.
Há dor, riscos ou efeitos colaterais?
Adriana tranquiliza as mulheres sobre o desconforto do procedimento. “A coleta será realizada utilizando-se anestesia, sendo, na grande maioria das vezes, uma sedação endovenosa”. Após a coleta, os óvulos são armazenados em nitrogênio líquido, podendo permanecer congelados por tempo indefinido. “Não existe prazo de armazenamento. O tempo que o óvulo fica congelado não interfere na sua qualidade”, contextualiza Adriana.
Sobre os custos, existe um custo de manutenção dos óvulos que geralmente são anuais ou semestrais. “Esses valores, geralmente, são bem acessíveis. O investimento maior é para o uso das medicações e o procedimento de coleta e congelamento dos óvulos”, revela a médica.
Já em relação aos riscos, ela afirma que são raros. “O principal risco era a Síndrome de Hiperestimulação Ovariana, que pode variar de quadros leves a graves. Porém, atualmente, dispomos de protocolos que tornam esse risco próximo de zero”.
Os efeitos colaterais, quando surgem, costumam ser leves e variam conforme a sensibilidade individual. “A grande maioria fica bem e não apresenta efeitos significativos, mas, quando apresenta, os principais são cólicas, dor de cabeça, náuseas e sensação de inchaço”.
Suporte emocional também é parte do processo
Além da avaliação médica e da parte técnica do procedimento, o suporte emocional também tem espaço nessa jornada. “O médico especialista deve sempre acolher e conduzir as mulheres de forma sensível e empática. Além disso, existem excelentes profissionais da área de psicologia especializados em reprodução humana que estão disponíveis para dar esse suporte”, conclui.